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O Presente

 

Ontem foi Dia dos Pais. Aquela data estrategicamente posicionada no calendário para empolgar os filhos e, por tabela, massagear o ego dos pais. Uma jogada comercial tão sutil quanto um outdoor piscando “Compre já!”. Mas tudo bem, a gente finge que é sobre afeto.

Tenho uma história para contar. Prepare-se, porque ela envolve emoção, suspense e... financiamento.

Em um desses dias comemorativos de algum ano perdido na memória, meu filho chegou com aquele brilho nos olhos e disse:

— Pai, vou te dar um presente.

— Deixa disso, filho. O que importa é o abraço, o almoço em família, aquela carne meio passada e o arroz com gosto de panela.

— Não, pai, quero te dar um presente. Podemos ir pra Piraju agora?

— Claro, filho. Vamos lá. (Confesso que já comecei a desconfiar. Piraju não é exatamente o polo dos presentes afetivos.)

Seguimos para a cidade vizinha. Tentei arrancar alguma pista do motivo da viagem, mas ele estava mais fechado que porta de banco em feriado. Chegamos numa concessionária de automóveis. Sim, uma concessionária. E eu, já com o coração acelerado e a carteira tremendo, soltei:

— Filho, não precisa exagerar. Um carro é demais. Meu carango velho pode até tossir na estrada, mas tem personalidade. O limpador não funciona na chuva? Isso é charme retrô. E aquela vez que ele quase nos deixou a pé no sítio? Uma memória inesquecível.

— Pai, relaxa. Você vai dar seu carro como entrada. Eu pago as três primeiras parcelas.

Aí começou o teatro. Fomos conversar com o vendedor, meu filho todo empolgado, dizendo que ia me dar um carro de presente. Eu já me sentindo enebriado com o cheiro de carro novo.

Na mesa, o vendedor, um profissional experiente em perceber a diferença entre a intenção e o saldo bancário, pergunta:

— O senhor vai financiar?

— Sim — respondi, com a confiança de quem ainda não entendeu nada.

— Em quantas parcelas?

— Em três.

Meu filho arregalou os olhos como se tivesse visto o IPVA de uma carreta.

— Não, pai! Três não dá! Tem que ser no mínimo dez parcelas! Eu pago as três primeiras.

— Ué, filho... não era um presente? Achei que você ia me dar o carro. Vamos voltar para casa, você me dá um abraço de Dia dos Pais e eu fico até mais feliz. Sem parcelas, sem boletos, só afeto puro.

— Tá bom, pai...

Voltamos para casa. Nunca mais tocamos no assunto do carro. Mas até hoje, quando ele me dá um abraço, eu sorrio por dentro... e penso nas três parcelas.

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